segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Crônica 72: Sobre Cafés, Culpas e Neologismos


Estava tranquilo. Um dia feio. Chuvoso. Daqueles em que sair da cama, ou da bandeja, nem pensar. Mas teve gente animada. Pessoas que decidiram tomar um delicioso e observador cafezinho. Pra esquentar. Sabe como é...
Assim, contra todas as expectativas criadas por mim – preciso deixá-las de lado – a casa lotou! Era café com chantilly para um lado. Com leite para o outro. Café com espuminha pra lá. Cafezinho expresso pra cá.
Um tal de garçom estressado correndo com a bandeja. E nessas horas, eu que me segure pra não cair.  Cliente irritado com a demora. Muito papo nas mesas. Beijos e abraços. E, principalmente, muita leitura. Revistas, livros, jornais, tablets, são amigos freqüentes.
Frequentei inúmeras mesas. Por fim, parei um pouquinho na mesa de um jovem casal. Os dois com um estilo bem particular no vestir. Mas eram jovens. Tinham uns dezoito aninhos e imaginei que ali eu teria uma boa dose de romance. Sabe, às vezes é bom.
No entanto, ao ser colocado na mesa. Junto ao açúcar e à colherinha. Me dei conta de que esse não era o caso. Minha ideia de um pouco de mimimi enquanto os pingos grossos caiam do lado de fora foi pro brejo.
“Você não vai dizer que a culpa minha, né?”, disse a jovem magrinha. Com um tom de voz baixo e bastante enfático. Não me dei ao trabalho de prestar atenção ao restante daquela conversa que começou e seguiria vazia.
Meu foco foi a questão colocada por ela. A culpa. Um ponto tão humano. Tão “Dostoévskiano”. Tão católica. Assim como Raskólhnikov, personagem de “Crime e Castigo”, as pessoas, hoje, vivem perturbadas. Sem saber como se tornarem melhor. E, principalmente, com culpa. Pelo que fizeram e pelo que não fizeram.
Acaba-se por não perceber que a culpa corrói. Atormenta. Falta, talvez, entender que a culpa inexiste, A responsabilidade, sim, É real. Palpável. E deve ser invocada em alguns momentos. Mas a culpa... Nada mais é que um sentimento abstrato. Usado para pesar sobre o outro. Ou vitimar a si mesmo. Como no caso em questão.
Não havia culpa naquela mesa. Podia haver qualquer outro fator. Mas não culpa. Eu saí antes que pudesse ouvir a resposta do rapaz. Mas se eu pudesse, diria: “Não, minha querida, a culpa não é sua. A culpa não existe. A culpa não é sólida. Não queira ter tudo, inclusive a culpa”.

Mariana Primi Haas - MTB 47229                                                                                                                                        Janeiro/2013

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Crônica 71: O Amigo Indiscreto


Dia desses teve um amigo secreto de fim de ano lá em casa. Estavam presentes todos aqueles que contribuem diariamente para que EU, o seu cafezinho, seja servido da melhor maneira. 
Chegaram todos ao mesmo tempo. Não era dia de uniforme. Foram todos muito bem arrumados. De branco. A casa também estava enfeitada para recebê-los. Em tons de dourado. Em um primeiro momento houve um certo estranhamento. Apesar dos efusivos cumprimentos e desejos de boas festas.

Aos poucos foram se sentindo mais a vontade. Era um tal de um medir com os olhos os pacotes e sacolas dos outros. Os comentários pretendiam-se discretos. Mas, nem sempre atingiam esse objetivo. Segredos do tipo: “você viu o que o Silva trouxe? Ele não gastou R$50 naquilo nunca”. Também acho que não. Deve ter sido aquela mulher dele que comprou... Metida...
Havia uma mesa no canto do salão onde todos depositaram seus pacotes. Alegres. Cheios de expectativas. “Sabe, não quero nem ver o que eu vou ganhar. Sempre dou coisa boa e ganho mixaria. Tenho muito azar nesses “amigos””. Nem me fale. E assim seguiam as duplas e trios. Fofocando. Futricando. Fuxicando. E os presentes nem haviam sido entregues, hein?

Beberam. Comeram. A cerveja fez muito mais sucesso que eu essa noite. Fiquei um pouco enciumado. Tristinho. Mas era compreensível. Acompanhei tudo do balcão. Não me imponho. Só apareço quando sou chamado. Talvez seja por isso que muitos se digam viciados em mim.
Mas, voltando à festa. Depois de alguns copos, a nossa gerente anunciou super animada: “E ai, vamos começar nosso “amigo”?”.

Cada qual retirou sua sacola. Sentaram-se. Foi bem interessante assistir de longe a confraternização. Só assim, pude observar os sorrisos amarelos. Os “muito obrigado” falsos. Os “Ai, querida, adorei”, ditos com tanto entusiasmo que se poderia acreditar. A menos que se prestasse bastante atenção ao amargor do olhar.
Pequenas maldades não foram poupadas. “A minha amiga secreta é linda! É a Janaína!” Muito obrigada! Nossa, o que será? Empolgou-se com o peso do presente. Ao abri-lo... Nossa... Um livro de regime? Questionou. Com os olhos voltados para sua barriguinha saliente. Obrigada...

Conforme os presentes foram sendo entregues, as caras de decepção e os comentários maliciosos foram aumentando. A gerente foi a única que, genuinamente, gostou da sua lembrança. Quase no fim da reunião, alguém lembrou: Não vamos tomar café? Afinal, é por ele que estamos aqui!
Emocionei-me. Deu até tremedeira. Cumprimentei a todos. Fim de festa. Depois que o salão se esvaziou fiquei ali. Analisando. Por que as pessoas fazem esse tipo de festa? Talvez para se sentirem parte de algo. Talvez para se iludirem, pensando terem espírito de equipe. Ou, simplesmente, para terem certeza que alguém dedicou a elas parte de seu tempo.

Humanos são mesmo engraçados. Não seria mais fácil apenas presentear a quem se gosta? Mas e se eu der e não receber? Mais fácil combinar a troca. Mais fácil ir pelo caminho conhecido. Mais fácil ser previsível.
Como diz um grande amigo meu, o adoçante, a carência é o mal do século (ele leu isso em algum lugar, eu sei, mas vive repetindo).

Espero, sinceramente, que todos meus amigos e leitores tenham um lindo 2013. Que continuem acompanhando o blog e gerando histórias para este cafezinho, aqui!
Com açúcar e com afeto!
O seu Cafezinho

Mariana Primi Haas - MTB 47229                                                                                                                                        Janeiro/2013