domingo, 25 de janeiro de 2009

Crônica 35: O Conselho

De volta ao Brasil. Às bandejas. Aos clientes e aos garçons. Ao meu trabalho. À minha vida. Que saudade boa. E na minha reestréia, a trilha sonora foi Toquinho e Vinícius. Não podia estar mais feliz.
Eu vinha confortavelmente instalado nas firmes mãos do garçom. Dei uma olhadela para a mesa a que estava sendo direcionado e no mesmo instante pensei: “hum, ali tem assunto...”.
Quem me aguardava era uma senhora muito arrumada. Usa um austero Tailleur. Seus cabelos bem penteados. Óculos. E uma boca excessivamente pintada de um vermelho paixão. Junto a ela outra senhora. Esta um pouco menos rígida com o visual. Para aquela tarde chuvosa havia escolhido um conjuntinho de malha. Bermudão e camiseta. Ambas bem gordinhas e muito falantes.
Ao ser colocado na mesa junto a anéis, pulseiras e brincos dourados – uma delas deve tê-los tirado – a conversa já havia começado. Fluía com muita naturalidade. Mantive-me ali, quietinho e imperturbável. Em determinado momento senti-me até mesmo esquecido. Ninguém tocou em mim. Aproveitei para observar.
Muito. E entendi. O tema central era o marido da senhora de lábios marcados de vermelho. Imaginei a sujeira que aquilo não faria em minha xícara...
- Você não sabe o que ele me disse outro dia!
- Saber eu não sei... Mas posso imaginar... Afinal, do Léo pode-se esperar quase tudo que seja indelicado!
- Tente visualizar a cena: estávamos no sofá, assistindo o Big Brother – que, aliás, eu detesto – ai resolvi perguntar, só de brincadeira, o que ele acharia se eu participasse de um programa desses...
- Sei... E...
- Bom, ele disse que eu só poderia participar se houvesse um Big Botijão! Acredita???
Os óculos caíram de seu rosto. Seu tom de voz aumentou. Era como se estivesse novamente vivendo a dramática situação. Como se o marido estivesse na sua frente dizendo tudo de novo. Começou a ficar vermelha como o batom. Cheguei até a pensar que a mulher fosse ter um treco.
De repente, eu que já estava gelado fui bebido de uma só vez. Puro. Que susto. Senti-me como se de um momento para o outro tivesse sido transformado de café em pinga.
A amiga, muito boazinha, disse:
- Mas e você, ficou quieta? Agüentou tudo calada? Espero que não!
- Claro que não! – Esbravejou – Eu me irritei tanto que resolvi jogar limpo e na mesma hora eu falei: e você???
Pensa o que??? Que tá com essa bola toda pra falar de mim??? E essa enorme barriga de chope??? Vê se te enxerga!!!!!
E a cada fala nossa narradora ia ficando mais vermelha. Mais nervosa. A amiga, ao invés de tentar acalmá-la com frases como: “fique tranqüila” ou “não pense mais nisso”. Continuou incensando a ira da outra:
- E o que aquele desclassificado respondeu???
- “Eu estava só brincando, meu doce de coco... Credo... Não precisa ficar tão brava... Você é e sempre será melhor que qualquer Big Brother...” – disse em tom jocoso como se estivesse imitando o homem.
- É, amiga. Ele é um idiota mesmo. Você está ótima! Um pouco acima do peso, é verdade, mas na nossa idade é assim mesmo...
As duas pararam o falatório e por alguns minutos entraram num silêncio profundo. Talvez estivessem pensando na conversa. Até que a amiga-palpiteira resolve cortar o silêncio e melhorar as coisas.
- Sabe, Lica, fique tranqüila, mas não esqueça que em toda brincadeira há um fundo de verdade....
Obs: Peço desculpas aos meus queridos leitores, mas ainda não me adaptei às novas regras ortográficas!


Mariana Primi Haas - MTB 47229
Janeiro/2009

domingo, 18 de janeiro de 2009

Crônica 34: O Rei Mago

Mais uma de Buenos Aires... E, desculpem queridos leitores, mais uma de um casal de turistas. Não tem jeito, a capital portenha é muito convidativa aos enamorados! Bem, segui minha busca a outros cafés. Novas experiências. Conhecimentos. Amigos. E, como não podia deixar de ser, novas histórias.
Coisas interessantes acontecem quando se está viajando e atento a tudo que acontece à sua volta. Dessa vez, estava em um café, dentro de um shopping na Calle Florida. Um lugar muito interessante. Cheio de gente. Aliás, a cidade toda estava assim. E, como já comentei, a maioria dos turistas eram meus co-patriotas. Estou eu lá. Quietinho. Quando vejo um jovem e belo casal com sua filmadora.
Num primeiro momento, imaginei que fossem os mesmos do dia anterior. Mas não eram. Outros dois. Paulistanos. Não estavam sentados à mesa. Estavam caminhando pelo espaço. Filmando tudo. Comentando. Mostrando as lojas. Nessa andança deram de cara com... Os “três reis magos”. Isso mesmo. Como ainda era época de festas o centro comercial mantinha sua decoração de natal.
Uma árvore enorme e um teatro com atores interpretando os reis magos. Diferente, né? Ao passarem filmando a pequena encenação um dos reis, chamou a atenção. Ele acenou, fez o símbolo do coração com as mãos e mandou beijos. Os brasileiros adoraram a interação e continuaram seu caminho.
Mais à frente cruzaram com o segundo “rei mago”. Este foi mais incisivo. Acenou. Chamou-lhes para perto. E engatou numa gostosa conversa:
- De onde vocês são? – indagou o artista argentino.
- Brasil!
- Brasil?! – Perguntou com grata surpresa
– Baltazar! Baltazar!
Atendendo ao chamado veio até o pequeno grupo, Baltazar. Era justamente aquele primeiro que se manifestou. Veio meio cabreiro. Desconfiado. Conversou um pouco. Até a jovem falar:
- Vai aparecer no Brasil!
Baltazar entendeu de imediato que seria algum programa. Que passaria na TV. No mesmo instante se animou. Mandou beijos. Abraços. Pediu caipirinha. E, por fim, lembrou a seus amigos que em fevereiro viria encontrar os “brazucas”.
Uma simpatia. Eu, de longe, no meu espaço, fiquei imaginando o que teria feito com que Baltazar relaxasse. Seria encontrar brasileiros e poder conversar um pouco? Talvez. Mas optei por outra hipótese: Baltazar estava enfeitiçado pela câmera. É impressionante o que um aparelhinho desses é capaz de fazer com o ser humano. O poder que ele exerce.
Acho que o simples fato de se imaginar aparecendo na televisão ou no cinema, ou seja lá onde for, tornou Baltazar receptivo e interessado. Tão interessado que falou por muitos minutos. O casal precisou interrompê-lo. Despedir-se. Sair devagarzinho. À francesa. Desligaram a câmera e, ai sim, sentaram-se para um delicioso cafezinho. Tem jeito melhor de acabar um dia de passeio?



Mariana Primi Haas - MTB 47229 
Janeiro/2009

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Crônica 33: A VIAGEM

Como devem ter percebido tive que me ausentar por um tempo. Sabe como é... Natal, ano novo chegando, enfim, dezembro e janeiro são meses corridos para todos. Além de tudo, tirei umas férias merecidas. É um leva e traz. Um vai e volta. Bandeja. Garçom. Burburinho. Ufa! Pois é, mas sabem onde fui parar?

Em Buenos Aires, ou seja, na terra dos “cafés”. É café pra todo lado. De todo jeito. Lá os cafés são também restaurantes. Servem desde um simples cafezinho até deliciosos – e bem servidos – pratos. É um em cada esquina. Eu estava no paraíso. O paraíso para um café, claro.

Minha passagem por terras portenhas foi tranqüila. Calma. Revigorante. Mas não pude deixar de observar os hábitos dos freqüentadores dos “cafés” de lá. Tão perto e tão longe. Uma das primeiras coisas que pude notar foi a elegância dos argentinos. Sou um café brasileiro, também não gosto muito de admitir, mas é um povo muito arrumado. Muito educado.

Os homens mais velhos, por exemplo, não se sentam para saborear um bom cafezinho sem estarem devidamente trajados de terno. Camisa. As mulheres, então, poderiam até dizer que são “peruas”. Mas, de qualquer forma, maquiam-se. Perfumam-se. Tudo apenas para saborear um de meus amigos.

E, como se pode imaginar, há os turistas. Uma infinidade deles. Em sua maioria, brasileiros. Sentam-se com olhos atentos a tudo a sua volta. Normalmente de mochila. Câmera fotográfica. Filmadora. Um bom mapa da cidade em mãos. E as conversas, invariavelmente, são os lugares pelos quais passaram e os que ainda irão visitar.

Os turistas normalmente vestem-se mais à vontade. Também, para andar o dia inteiro não convém usar terno ou salto alto. Chamou-me a atenção um casal de turistas brasileiros, sentados na mesa ao lado.

Acenderam um cigarro. E ficaram como eu, apenas descansando.

- Amor, você não vai filmar a Florida? – dizia ela.

- Claro que vou... Já já – respondia seu companheiro.

O tempo passou. Os dois continuaram ali, sentados. Tomando um cafezinho. A tarde vinha caindo. E nada de filmagens.

- Amor, filma a Florida, vai? Daqui a pouco anoitece e a gente perde a oportunidade...

- Tá bom – disse ele. Animando-se.

Filmaram a Florida. Divertiram-se. Riram muito. Senti-me feliz ao vê-los tão contentes. Era contagiante. Que delícia. Que coisa boa poder aproveitar momentos de felicidade plena.

E, por fim, como diria Dostoievski: “Há momentos, e você chega a esses momentos, em que de repente o tempo pára e acontece a eternidade”.

Aproveite seus momentos e curta suas eternidades. É o que deseja esse simples café.

Bem-vindos a 2009!



Mariana Primi Haas - MTB 47229 
Janeiro/2009