segunda-feira, 16 de maio de 2011

Crônica 53: O Metrô

Sentam-se um menino e seu pai. É domingo. Dia de ficarem juntos. Aproveitarem o momento. E é o que estão fazendo. Mesmo com a chuva que cai. Até que surge uma pergunta bem difícil de responder. Mas bastante necessária.
- Pai... O que são “pessoas diferenciadas”?
“Hum... E agora?” Pensou, ele. O quê responder. Como explicar a complexidade do tema para uma criança de 10 anos. Fez-se silêncio. O pai olhou à sua volta. Até ver uma garçonete. “Ufa!”.
- Mocinha. Veja pra mim um café quentinho e um suco de laranja para o rapaz aqui.
Fui chamado. E rapidamente cheguei. Estava curioso para saber a resposta. E, principalmente, para entender a pergunta. “Pai!”. “Oi”. “Então... Você sabe a resposta?”, insistiu o menino. Claro que sei. O que seu pai, aqui, não sabe?
- Bom. Pessoas diferenciadas são aquelas que fogem às regras. É isso. - Respondeu o pai. Orgulhoso por ter se saído bem. E continuou brincando com o menino, conversando sobre futebol. O jogo do Corinthians. Até que...
- Pai. Entendi. Mas então pessoas que andam de metrô fogem das regras? A mamãe me leva para a escola de metrô. Somos diferenciados?”
- Claro que sim. São diferenciados. Evitam usar o carro e poluir a cidade.
O menino ficou pensativo. Mexeu o canudinho do suco. Deu um gole.
- Mas, pai. Se andar de metrô é bom, por que tem gente que não quer metrô onde mora?”
O pai novamente ficou sem resposta. Olhou para os olhos negros como café do filho. Pensou em sua ingenuidade. Primeiro decidiu dizer que essas pessoas são babacas. Depois resolveu que essa não era a melhor opção. Já estava saindo fumaça de suas orelhas.
Tomou um gole de mim. Olhou-me. E disse:
- São pessoas ignorantes. Não sabem o que dizem. Preferem viver presos no bairro deles convivendo apenas com outros prisioneiros que tenham os mesmos hábitos, entende?”
- Não. Porque a professora me falou que bairros e ruas são espaços públicos. Pertencem a todos. Não podem ser fechados. Mas, sim, democratizados. Vivemos numa democracia, sabia?”
- Eu sei filho.
- Sabia que democracia significa Governo do Povo? Então, por que aquela mulher falou que não quer o povo perto dela?
O pai, atônito com a resposta do filho, limitou-se a tomar a terceira dose de seu cafezinho. Depois dessa acho que eu, também, não preciso dizer mais nada, né?

Mariana Primi Haas - MTB 47229                                                                                                                                        Maio/2011

sábado, 7 de maio de 2011

Crônica 52: O Escritório


Hoje, pela primeira vez, fui levado a um lugar diferente. Completamente estranho e novo aos meus olhos de café. Tudo começou com uma jovem, muito bem arrumada. Ao invés de sentar-se ela caminhou até o balcão. “Um puro para viagem, por favor,”. Estranhei. Pensei: o que seria um puro? E mais: de que viagem ela falava?
Pois é, o puro era eu. E a viagem era minha também. Uma novidade lá em casa. Agora quem não puder se sentar para degustar seu cafezinho, pode me levar junto para onde quiser. Achei até interessante. Em minutos sai nas mãos da minha amiga.
Nada aconchegante esse vôo. Em primeiro lugar eu fui de classe econômica, ou seja, estava acomodado em um copo de isopor com tampa. O que para mim é péssimo. Depois, eu disputava espaço nas mãos dela com pasta, agenda, celular – é claro que ele tocou e eu quase fui derrubado – a bolsa caindo. Enfim.
Chegamos ao nosso destino. Fui colocado em uma mesa de cozinha. E ali fiquei aguardando que ela voltasse. Assustado. “Alguém quer um gole de café?”. Essa não, eu ia ser dividido? Era só o que me faltava...
Mas felizmente essa desgraça não aconteceu. Ufa! Não é ser chato. Mas não sou um café de garrafa térmica. Sou um expresso puro de grãos selecionados. Após um tempo interminável, ela voltou. Adoçou-me. E fomos para um espaço molhado (estava chovendo), do lado de fora do escritório. Ela pegou outro amigo meu – o cigarro – e ali relaxou por dez minutos.
Ficamos tranqüilos. Em paz. Ela parecia pensar no que tinha para fazer durante o dia. E naquele curto período de tempo, parecia grata a mim. Por estar ali. Por ter aceito esse estranho convite. Eu era a desculpa para que ela parasse, antes mesmo de começar.
Apesar do frio. Da chuva. E do muro molhado em que fui apoiado. Senti-me bem em viver aquele momento. Ajuda-la a respirar. Ela me olhava como a um bálsamo, me via como o melhor momento antes de começar o dia.
É. Mas melhores momentos acabam rápidos. Ela foi chamada. E eu tive que voltar. Já tinha dado minha hora...

Mariana Primi Haas - MTB 47229                                                                                                                                        Maio/2011