domingo, 24 de maio de 2009

Crônica 49: O Ponto


Tenho novidades essa semana. Em frente à minha casa agora há um ponto de ônibus. Muita gente não gostaria dessa novidade, mas pra mim, um cafezinho contador de “causos”, é ótimo. Muitas vezes, quando estou em mesas silenciosas posso prestar atenção nas histórias do ponto.
E olha que são muitas. O mais interessante é que lá na rua, no ponto, o público é outro. Heterogêneo. São estudantes, estagiários, profissionais, domésticas, garis, pessoas apenas passeando, amigos, namorados. Enfim, tudo que se possa imaginar.
Ontem foi o primeiro dia dessa confusão toda. A maioria nunca entra para conversar comigo. No entanto, mesmo assim, posso saber das notícias, assuntos e fofocas de cada um direto do conforto da minha mesa.
Algo que notei foi o uso dos celulares. Mas não da forma implicante com que sempre falo dele. Afinal de contas,quando esses aparelhinhos estão longe de mim, não me dizem respeito.
Observei, porque às vezes a pessoa está sozinha no ponto, sem ter o que fazer, nem com quem falar e saca logo o celular. E uma longa conversa – unilateral – se estabelece. Conta-se o dia inteiro. Fofoca-se. Diz-se do dia no trabalho, do namorado. Fala-se mal de muita gente.
O que me intriga é a capa de vidro isolante que se forma no entorno daquele que tagarela sem parar ao telefone. A impressão que dá é que não há mais ninguém no mundo. Que só existem ele e o minúsculo aparelho em suas mãos.
Sabe, a impressão que dá é que as palavras ditas ali ficam presas dentro o celular. Que ninguém do mundo externo ao seu poderá ouvi-lo. E, mais, chego a pensar que quem está do outro lado da linha é o menos importante. O que realmente existe para o dono do aparelho é ele mesmo.
A redoma formada já é tão eficiente que não há nem mesmo a preocupação de que a pessoa de quem se fala poderia ouvi-lo. Ou até mesmo alguém conhecido passar e prestar atenção no que está sendo dito.
Dia desses um rapaz ouvia música em seu “mil e uma utilidades” e ao mesmo tempo falava sem parar pelo alto falante. O ônibus chegou, ele dirigiu-se ao transporte e subiu. Enrolou-se todo com o fio. Quase cai dos altos degraus. Mas não desligou.
Penso eu, quantas possibilidades não são perdidas em momentos como esse. Quantas oportunidades de conhecer melhor a si mesmo. De olhar o caminho do ônibus. De saber quem pega o mesmo ônibus todo dia com você. De, simplesmente, ouvir o próprio silêncio. Enfim, viver o mundo ao invés de flutuar com vendas nos olhos e celular no ouvido.

Mariana Primi Haas - MTB 47229                                                                                                                                        Maio/2011

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Crônica 48: O Dia

Final de semana das mães. Pois é, presenciei uma cena interessante. Sentam-se à mesa duas jovens. Deviam ter mais ou menos dezesseis anos. É a idade da rebeldia. Da contracultura. As duas vestidas de forma jovial e conversando alegremente. Uma delas pediu uma coca-light e a outra, muito mais refinada, pediu um bom e preto café. Eu mesmo.
Juntei-me às duas. Peguei a conversa no meio, mas consegui entender. O assunto era “Dia das Mães”. Uma delas, mais loira, dizia:
- Não sei pra que dia das mães?
A outra arregalou os olhos e fitou a amiga assustada.
- Como não sabe pra que?
Com jeito impaciente, a menina respondeu:
- Claro, é uma data panfletária! Puramente comercial! Eu acho o fim da picada.
A outra parou. Pensou. Analisou. Até que por fim, respondeu pensativa.
- Pode até ser, mesmo...
- Como pode até ser? Claro que é!
Mais um momento de reflexão da interlocutora.
- Sabe, eu não acho, não – disse decididamente.
- É óbvio que é! “Dia das mães” é todos os dias do ano. Não é preciso um único, entende? Isso é só pra ganhar dinheiro em cima de gente “boba”, feito você, que cai na armadilha capitalista das propagandas.
- Que ”Dia das Mães” é todo dia e tenho certeza. Porém, o que não sei é se as pessoas demonstram esse amor todos os dias ou se compram presentes e preparam café da manhã antes dela ir trabalhar. Talvez esse dia panfletário como você diz, sirva para lembrarmos de homenagear, ao menos um dia no ano, essa pessoa que nos deu a vida e tanto nos ama.
A revoltada ficou mais calma. Pensou, pensou e finalmente disse:
- Olha é uma data comercial e ponto.
As duas emburraram acabaram de comer o salgado que pediram quietas. Quem quebrou o silêncio foi nossa amiga loirinha:
- Bom, vamos embora? Ainda preciso passar no shopping e comprar o presente da minha mãe... Ela quer uma bota – disse ficando com as bochechas coradas.
Panfletária ou não. Essa é uma data que merece ser comemorada. Esse cafezinho é apenas um grão. Não tem mãe. Mas espera que todas tenham tido lindos domingos, almoços ou jantares, juntos aos seus filhotes. Parabéns a todas!

Mariana Primi Haas - MTB 47229                                                                                                                                        Maio/2009