Estávamos ali. Como sempre. De repente, ela começou a observar seu
rosto no reflexo do vidro à sua frente. E, por mais inusitado que pareça,
admirou sua imagem. Enquanto me bebericava. Lentamente. Pensando no que via. Era uma mulher arrumada.
Talvez o cabelo pudesse estar mais ajeitado. Mas ninguém pode estar perfeito
todos os dias. Desculpou-se pelo desleixo. Distraiu-se. Retirou o jornal de
cima da mesa e continuou lendo. Mas, foi por pouco tempo.
Sem mais, pegou a si mesma num flagra. Olhou-se no espelho
lateral. Viu sua imagem. A minha e do jornal. Pensou: que cena interessante.
Luz adequada. Parecia uma fotografia enquadrada. Daquelas que quando vemos
pensamos: o que estaria acontecendo naquele momento? Quem é aquela pessoa? No
que ela estaria pensando?
Parou novamente. Quem é aquela mulher? Não sabia responder.
Começou a imaginar possibilidades para ela mesma. E, sem mais, sua imaginação
se mesclou à sua realidade. Sim. Histórias quede tão fantasiosas, pareciam ter
saído de um livro de Cortázar. Mas eram reais. E seu protagonista era ela. Não
aquela do espelho. Era ela. A que estava sentada comigo.
Fez mais um intervalo. Olhou ao longe. Tomou uma xícara inteira do
seu cafezinho favorito. Eu. E voltou a analisar-se. Que interesses tem essa
mulher do espelho? Por que ela está sozinha numa quarta-feira à noite? Apenas
acompanhada por seu fiel escudeiro, o Cafezinho... E assustou-se com as suas
respostas. Ela não sabia quais os seus interesses. Não sabia por queestava ali,
sozinha. Afinal, nunca fora uma paladina da solidão. Não enquanto necessidade
básica.
Percebeu que lia o jornal sem se aprofundar em tema algum. Apenas
lia. Em alguns momentos sorria. Em outros se indignava. Mas nada daquilo a
tocava. Ela queria muito. O que por vezes pode ser bastante problemático. E foi
ali. Juntinho de mim. Que descobriu quem era e o que desejava para o seu
futuro. E descobriu que apenas não sabia como fazer. Como colocar seus planos
em prática. Foi naquele instante que teve o maior encontro que poderia ter.
Consigo. Imagem. Corpo. E alma. Puderam se juntar novamente em um único ser. E
agora ela correria. Muito. E faria acontecer tudo que sempre sonhou. Apenas não
tinha tido coragem de sonhar.
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